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Dois lados de uma mesma coisa

É muito tentador olhar para o lado negativo das coisas.

Mesmo que sempre tente me manter concentrada no que estou fazendo, sem cair em comparações ou criar metas sufocantes, é inevitável que, quando menos estiver esperando, pensamentos autodestrutivos vão tentar dominar sobre qualquer bom sentimento que possa cultivar com cuidado.

A vida de uma pessoa que se dedica à arte de forma autônoma, sem retorno financeiro, é bastante solitária e dolorida. Com muito custo consegui conquistar algumas pessoas que acompanham meu trabalho. Cada uma dessas pessoas é muito importante para mim, mesmo que eu jamais as tenha encontrado e mesmo que, no momento em que o pior sentimento de solidão me atinja como um soco, eu não possa pedir algum conforto.

Não, não existe conforto para quem escolhe a arte. Especialmente em um sistema que combate a arte, que vê toda expressão pessoal como inimiga e que premia apenas alguns muito poucos sortudos com algum retorno social e financeiro. De muitas formas é esse sistema e a dor intrínseca do processo que faz muitos desistirem da arte e, de algumas poucas formas, essa dor e angústia pode ser um motor doloroso para continuar.

Mas não é bom sentir-se dessa forma.

É tentador, porque é real. A solidão é real. A dúvida é real. A falta de provas de que você realmente existe e tem algo importante para falar é muito real. A certeza de que estas, estas mesmas, palavras jamais serão lidas ou levadas em consideração é real. É real que esta é uma batalha que, se vista como uma batalha, só pode ser entendida como uma batalha perdida. Um grito que jamais será ouvido e irá apenas existir enquanto houver vontade de continuar rasgando a garganta.

Mas,

existe um outro lado.

O lado que está ali, esperando ser olhado. Tão tolo e bobo, mas milagrosamente belo e feliz.

Fazer arte é libertar a alma, os pensamentos, os sentimentos, por um breve momento da angústia de estar preso à realidade. A arte nos diverte, nos fascina e nos faz sentir bem. Nem toda a arte, claro, mas este é um texto pessoal. A arte é como um brinquedo, é uma forma de tornar tudo o que é complicado e feio em algo feio ainda, mas que se pode olhar de outra forma mesmo assustadora.

Talvez ninguém leia realmente estas palavras, ou lhes dê alguma atenção, talvez. Mas isso não vai mudar a alegria que escrever outras palavras, ou desenhar ou programar uma narrativa interativa, podem me trazer.

É tão tolo e bobo quanto simples. E ainda assim real. Só poderia ser mais simples se não fosse tão difícil lembrar disso.

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